A falta de uma UTI Neonatal em
Caicó, cidade polo na região, é reivindicação antiga do Seridó. Foi para
debater o problema e encaminhar soluções que a Assembleia Legislativa do Rio
Grande do Norte (ALRN) realizou, na noite desta terça-feira (15), uma audiência
pública na Câmara Municipal da cidade. Com o tema “UTI Neonatal para Caicó:
Possibilidade e Perspectivas”, o debate foi uma iniciativa do deputado Adjuto
Dias (MDB) e reuniu representantes do Governo do RN, Ministério Público,
Tribunal de Justiça, Sindsaúde, Conselho de Medicina, Conselhos Tutelares,
OAB/RN, lideranças políticas da região, entre outros representantes da
sociedade civil. O ex-prefeito de Natal, Álvaro Dias, também participou. “Esse tema é de tempos atrás e
voltou a ser debatido quando infelizmente no decorrer desse ano, em março, veio
a falecer um bebê de 30 dias que esperava pelo seu encaminhamento a uma UTI
Neonatal e aconteceu essa tragédia, trazendo à tona toda essa discussão”,
afirmou o deputado.
Adjuto se referiu à morte prematura do bebê José Emanuel Medeiros Silva, em
Caicó. O fato aconteceu em março deste ano e a vida do recém-nascido poderia
ter sido salva se a cidade dispusesse desse tipo de leito. A remoção já estava
autorizada para Mossoró, mas o quadro de saúde se agravou e o bebê foi a óbito
antes da transferência. À época, o Ministério Público (MPE/RN) abriu um
inquérito civil para investigar as circunstâncias da morte e definir medidas
judiciais para prevenir casos parecidos. Adjuto destacou que os leitos
voltaram a ser debatidos e cobrados. Os pais da criança, Evelin e Augusto,
participaram da audiência. “As discussões sobre esse tema têm avançado e a
audiência é uma oportunidade dos representantes do povo mostrarem quais as
perspectivas futuras e o modelo de financiamento de cada ente envolvido”,
disse. O subcoordenador da Unidade de
Acompanhamento dos Consórcios Interfederativos de Saúde, Matheus Ferreira
Bezerra, representou a Sesap e afirmou que trazia boas notícias para o Seridó,
pois o governo estadual está em articulação com o governo federal, diante da
possibilidade de financiamento de leitos pelo consórcio de municípios do Seridó
e disse que o projeto está avançando. Afirmou ainda que o trabalho para
implantação dos leitos está sendo estruturado.“É preciso verificar a
manutenção e custeio, porque são leitos específicos, caros e não adianta
implantar por implantar. A prefeitura de Caicó se comprometeu a fazer a cessão
do espaço físico e o governo a cessão dos equipamentos. Todos os entes já estão
muito bem alinhados e a Vigilância Sanitária já apresentou para a prefeitura
tudo o que necessita ser mudado no local e a reforma já foi iniciada”, disse.
Segundo ele, a partir da reforma, serão feitas as contratações. “Avançamos
muito nesses últimos dias”, contou. O promotor de Justiça (1ª
Promotoria de Justiça de Caicó) Vicente Elísio, lamentou a recorrência dos
mesmos problemas de sempre afetando a população. “Temos questões repetidas, que
são reiteradas e que passam para o cidadão a sensação de que pouco ou muito
pouco acontece no sentido de mudança positiva, transformação e progresso”,
afirmou, parabenizando o deputado Adjuto Dias pela iniciativa da audiência. Geraldo Rufino, da 2ª
Promotoria de Justiça de Caicó, citou reunião passada na qual a prefeitura de
Caicó assumiu compromissos com o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e citou
a necessidade de haver um cronograma para a promotoria poder acompanhar e cobrar
os avanços necessários. “Queremos saber prazos, por exemplo, sobre a conclusão
da reforma do espaço físico, e outras medidas que estão na alçada do
município”, disse. O promotor sugeriu também que em paralelo à instalação de
leitos de UTI Neo, é importante o Seridó reivindicar o Hospital Universitário,
numa luta apartidária e com a união de todos os entes e poderes. “Essa é uma
luta sem cor, em nome do Seridó”, frisou.
O ex-prefeito de Natal, Álvaro
Dias, disse que a saúde pública em Caicó deixa muito a desejar. “O governo
deveria fazer um investimento mais forte e consistente nos hospitais regionais,
para que eles tenham resolutividade. Seria uma forma de descentralizar os
atendimentos que se acumulam e dão sobrecarga muito grande para o município de
Natal”, disse. Álvaro afirmou que por não terem resolutividade, os municípios
repetem a prática da “ambulancioterapia”, enviando pacientes para Natal e
sobrecarregando os serviços de saúde da capital. Diretora do Hospital Estadual
Telecila Fontes, Vanessa Dias disse que a unidade conta com dois leitos de
estabilização que servem para o atendimento do público pediátrico e neonatal.
“Os pacientes que apresentam complicadores podem ser atendidos e estabilizados
para só então serem removidos para a referência da Sesap, em Santa Cruz e
Natal”, disse. Ela defendeu que as demandas
de saúde dos municípios possam ser resolvidas nos âmbitos das próprias regiões
de saúde: “A transferência de pacientes deveria ser a menor parte do processo e
a Sesap tem trabalhado muito neste sentido. Claro que não vai resolver em
poucos anos esse subfinanciamento da saúde, mas é preciso dizer que já houve
uma grande qualificação”, afirmou. Presidente do Conselho
Regional de Medicina (CREMERN), Marcos Antônio Tavares Jácome, afirmou que a
assistência é deficitária há tempos. “Aqui a gente vê apenas o reflexo
regionalizado dessa deficiência, que é ainda maior por falta de outros leitos,
vemos pacientes de leitos intermediários ocupando leitos de UTI e no RN
continuam faltando leitos de cuidado intermediário”, exemplificou.
Ele chamou a
atenção para o fato de que Caicó agrega e interliga municípios. Ele citou
problemas como a deficiência de profissionais especializados em terapia
intensiva e sugeriu o apoio de residentes a essa área. “O importante é
vislumbrar o futuro, não só instalar UTI, mas ela funcionar sem entraves. Temos
equipes contratadas no RN que começam a trabalhar e logo param de receber e
isso gera um impasse gravíssimo”, analisou. A mesa de autoridades ainda
foi composta pelo vice-presidente do Conselho de Saúde de Caicó, Juscelino José
Rodrigues e o coordenador do Sindsaúde, José Joaquim Sobrinho. Juscelino
afirmou que a regulação é uma luta diária. “Temos que ligar para um e para
outro, porque a regulação é algo complicado”, disse. O vice-presidente do
Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente, José Carlos Martins,
historiou que foi o movimento de mulheres, em Caicó, quem encabeçou a luta por
UTIs neo. “A região já sofreu muito nesse sentido. A criança e o adolescente
têm prioridade absoluta na destinação de recursos públicos, na nossa
constituição (federal), mas se torna letra morta porque não se operacionaliza e
as políticas públicas são deficientes. E a mortalidade segue como uma grande
ferida aberta”, criticou. Quando as participações na
mesa de convidados se encerraram e o debate foi aberto para quem participava da
plateia, a educadora e militante feminista Nalva Medeiros historiou que as
discussões sobre as UTIs neonatais foram iniciadas há muitos anos por um grupo
de mulheres. “Essa luta não é nova, começou em 2011 pela alta taxa de
mortalidade entre as mulheres. É preciso se pensar numa ação e enquanto isso,
esperamos que não morra mais nenhuma criança”, afirmou.