
O juiz Sérgio Moro e o ex-presidente Lula (Igo Estrela/PMDB e Adriano Machado/Reuters)
O embate entre a defesa de Luiz Inácio Lula da
Silva e o juiz Sérgio Moro ganhou um novo capítulo na
segunda-feira. Advogados do ex-presidente pediram que fossem ouvidas 87
testemunhas em duas ações contra ele na Lava Jato. Moro disse que não
proibiria a grande quantidade de testemunhas, pois poderia ser acusado de
cercear o direito de defesa de Lula. Mas exigiu que o ex-presidente
compareça a todas as sessões. Cristiano Zanin Martins, que
defende Lula, considerou a exigência “mais uma
arbitrariedade” contra o seu cliente. Três especialistas em direito
ouvidos por VEJA concordam que houve excesso da parte do juiz ao exigir
a presença do ex-presidente nas oitivas. Já o pedido da defesa divide opiniões.
Davi Tangerino, professor de Direito Penal e Processo Penal
da FGV Direito SP“O Código Penal fixou o número aleatório de oito
testemunhas por réu. Com o passar do tempo, esse critério foi sendo
flexibilizado pelos magistrados e hoje alguns aceitam ouvir 15, 20 pessoas. Mas
87 parece exagerado – é um jogo de cena da defesa de Lula. Acho que o modelo
mental da decisão de Moro foi: se eu forçá-lo a comparecer às 87 sessões, ele
vai desistir das testemunhas irrelevantes. O problema é que o réu não tem
obrigação de se defender, tem direito. A decisão de Moro é ilegal e viola a
Constituição, o pacto internacional de direitos humanos e o entendimento das
cortes superiores. A defesa pode impetrar um habeas corpus no Tribunal Regional
Federal (TRF) requisitando a dispensa da presença do Lula. Caso o TRF retire a
condição imposta, não vejo como o magistrado possa voltar atrás e dispensar
algumas testemunhas. Moro pode cair na própria armadilha.”
Flávio Leão Bastos Pereira, professor de Direito
Constitucional da Universidade Presbiteriana Mackenzie“Há dois aspectos
incomuns nesse caso. O primeiro é a defesa pedir a oitiva de 87
testemunhas, um número elevado. O juiz não tem obrigação de
aceitar todos os pedidos e muitas vezes dispensa testemunhas que considera
desnecessárias. O segundo ponto incomum – confesso que nunca tinha visto – é o
magistrado obrigar a presença do réu nas sessões. O réu ou indiciado tem direito
de se defender, e não obrigação. Não vejo razão clara para a necessidade da
presença de Lula nas oitivas. A determinação de Moro não chega
a ser ilegal. Seria ilegal se ele obrigasse por condução coercitiva, por
exemplo. Parece mais uma condicionante. Mesmo assim, a defesa pode contestar a
determinação do magistrado, e creio que o fará, no TRF.”
Thiago Bottino, professor de Direito Penal da FGV
Direito Rio“É direito da defesa pedir a oitiva de 87 testemunhas.
Não há abuso. Embora a lei tenha fixado o número de oito testemunhas por réu,
essa questão já foi relativizada pelo Supremo. Cabe ao juiz acatar ou não os
pedidos. Se Moro aceitou as 87, é porque concorda haver motivo para ouvi-las.
Ele não teria errado se tivesse indeferido uma parte dos pedidos. Mas não há
previsão legal para exigir a presença do Lula nas sessões. O entendimento do
Supremo é claro: a defesa é um direito, não obrigação. Isso não é um jogo que as
pessoas fazem as leis como querem. A defesa, agora, pode pedir para o magistrado
reconsiderar seu despacho, recorrer ao TRF ou simplesmente ignorar a
determinação do juiz. O que Moro vai fazer se o ex-presidente não comparecer às
sessões? Mandar prendê-lo? Ele não pode fazer isso.”
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