
A farda
custou R$ 240. O coturno, na promoção, foi R$ 170. Se pagarem do próprio bolso
o conserto dos carros parados no estacionamento, são recompensados com dias de
folga. Os sacos de gesso para reformar as paredes gastas foram doados por
vizinhos. Já a reforma foi feita pelos próprios policiais militares. Esse é o
ambiente de trabalho na 2ª Companhia do 9º Batalhão da Polícia Militar do Rio
Grande do Norte. A Folha visitou
a unidade e ouviu os relatos dos próprios PMs. E a situação, dizem, é a mesma
em todas as outras companhias do Estado. Com os salários de novembro, dezembro
e 13º atrasados, a maior parte dos agentes do Estado está aquartelada há mais
de duas semanas –isso motivou a chegada das Forças Armadas na semana passada.
Os PMs,
porém, negam que estejam em greve: dizem que comparecem aos batalhões, mas não
podem sair às ruas com coletes balísticos vencidos e carros danificados e sem
documentação. “Não tem nem munição. A gente sai com dez balas na arma por dia.
Se se envolver em tiroteio, volta e acabou. Se tiver ocorrência grave, não tem
como atender. Dá para trabalhar assim? Vou sair com colete a prova de balas
vencido?”, indaga um cabo. “Meu motorista aqui não tem nem habilitação.” Sem
folha sulfite, diz, não consegue nem imprimir a escala de trabalho dos agentes.
Na 2ª Companhia, nenhum dos sete carros funcionava. O cenário é o mesmo em
outros locais: a 3ª companhia do 5º BPM é mais organizada, dizem os agentes,
porque fica em área rica e vizinhos pagam por reformas. Os agentes fizeram uma
vaquinha para comprar coletes. “Tive que
pedir dinheiro ao meu irmão para pagar a conta de luz. O banco liga me cobrando
dívida o dia todo. Eu digo: ligue para o governador”, conta um soldado.
Os agentes
têm receio de se identificar sobretudo depois de decisão judicial que, no
domingo, determinou que os chefes da PM, dos bombeiros e da Polícia Civil
prendam em flagrante os agentes que promoverem, incentivarem ou colaborarem com
a paralisação. “E ainda
impedem a gente de trabalhar com outra coisa. Eu trabalho 24 horas e folgo 72
horas. Mas vou fazer segurança de loja nesses três dias ganhando R$ 50. Porque,
se não, como vou almoçar?” A situação
dos carros é admitida pela Secretaria de Segurança, que baixou portaria em que
exime os agentes de riscos ou danos que os veículos possam causar “já que se
trata de estrito cumprimento de ordem judicial”.
BAIXO EFETIVO
Hoje, no
Estado, são pouco menos de 8.000 policiais militares, segundo a PM. O total vem
caindo: em 2011, eram 11 mil agentes, diz a Associação de Cabos e Soldados da
PM. O efetivo previsto em lei é de 13.466 agentes. “O crime se organizou, a população cresceu, e a polícia diminuiu”, diz Roberto
Campos, da Associação de Cabos e Soldados, que afirma nunca ter enfrentado
crise parecida.
Um policial
entra hoje na corporação com salário de R$ 2.904 e vale alimentação de R$ 10.
Segundo levantamento de 2015 da Anermb (associação de entidades da PM e
Bombeiros), o vencimento é o 19º entre os 27 Estados. Com a paralisação, o
Estado registrou uma ligeira alta na taxa de crimes violentos. Presidente
da Associação de Subtenentes e Sargentos, Eliabe Marques diz que “sofre com
esse número porque também é população”.”A nossa intenção não é causar o terror
e até pedimos desculpas. Mas na certeza de que estamos fazendo a coisa certa.
Porque não dá para trabalhar sem qualquer proteção”, diz. Oficialmente,
a PM reconhece que, “por questões orçamentárias”, falta fardamento, mas diz que
isso “não implica que todos os policiais ficam sem receber uniforme”.
A corporação
nega, entretanto, que haja coletes balísticos vencidos. Diz que recebeu 3.000
unidades do governo federal, suficiente para o efetivo que faz o patrulhamento
nas ruas. Diz que a munição em estoque é suficiente para as ações da
corporação. A PM diz
desconhecer incentivo a policiais que restaurarem veículos. Reconhece que há
uma baixa no efetivo, mas afirma que o governo lançará em breve edital para
contratar 1.000 novos agentes. O Governo do
RN afirma que terminará de pagar o mês de novembro até sábado (6), pagando os
salários de quem ganha acima de R$ 4.000. O 13º salário, deve ser depositado “o
mais breve possível”. A Polícia
Civil também está parada. “Se eu for preso é até bom, que aí tenho almoço e
jantar”, diz um agente.
As informações são de THIAGO AMÂNCIO e BRUNO SANTOS –
Folha de São Paulo/VTASSU
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