Doani Emanuela Bertan. A professora paulista Doani Emanuela Bertan está entre os 10 finalistas do Global Teacher Prize Varkey Foundation/VEJA.com
Nos idos dos anos 1980, quando
a apresentadora Xuxa Meneghel cantava “A de Amor, B de Baixinho, C de Coração”
na televisão em língua de sinais, a paulista Doani Emanuela Bertan teve seu
primeiro contato com a linguagem para deficientes auditivos. De lá até ser
eleita uma das dez melhores professoras do mundo pelo Global Teacher Prize,
espécie de Prêmio Nobel da Educação, Doani precisou percorrer um longo caminho:
foi catadora de papelão, artesã e telefonista antes de se tornar a primeira da
família a ingressar na universidade de pedagogia. Aos 18 anos, ela fez um curso
de libras e percebeu as dificuldades que os surdos enfrentam na hora de se
comunicar e ali decidiu que seria professora. “Já entrei na faculdade
sabendo que ensinar a Língua Brasileira de Sinais era a minha a minha vocação.
Desde cedo minha mãe me dizia que a educação era a única maneira de mudar de
vida e passei a querer ser uma ferramenta dessa transformação”, conta Doani,
que hoje é professora bilíngue na Escola Municipal Júlio de Mesquita Filho, na
cidade de Campinas, em São Paulo.
Na escola desde 2012, Doani
pode assistir a uma mudança que gerou grande impacto na vida de seus alunos. Há
três anos a sala exclusiva para estudantes surdos ou com algum grau de
deficiência auditiva foi extinta, dando lugar à docência compartilhada, onde
surdos e ouvintes assistem a mesma aula, na mesma classe, com duas professoras.
“Montamos o roteiro do que será ensinado juntas e nos dividimos na hora de
falar. Essa é a verdadeira inclusão”, afirma a professora, que considera a
exclusão social o maior problema enfrentado pelas escolas, especialmente nestes
tempos bicudos de pandemia de Covid-19. Antes mesmo que a quarentena
impusesse a necessidade das aulas virtuais, Doani já ministrava o conteúdo dado
aos seus alunos no canal do Youtube Sala 8, com cerca de seis mil inscritos.
Mas, se antes ela fazia resumos de Português, Ciências, Geografia e Matemática,
agora ela também promove atividades, além de ter incluído a disciplina de
História. “O trabalho aumentou muito na pandemia e hoje conto com a ajuda do
meu marido para editar o material. Mas é reconfortante saber que mais
estudantes têm acesso a uma aula inclusiva“, diz Doani. Se for escolhida no próximo
dia 3 de dezembro como a melhor professora do mundo pelo Global Teacher Prize
2020 e ganhar o prêmio de 1 milhão de dólares, a brasileira vai investir no
Sala 8 para que a plataforma, que hoje reúne conteúdos para alunos do 1º ao 5º
ano do Ensino Fundamental, seja ampliado até o fim do Ensino Médio. “Já tenho
todo o projeto na minha cabeça, só falta receber o prêmio.
Quero promover a
educação inclusiva para todos e ter cursos profissionalizantes para que mais
alunos, surdos e ouvintes, tenham oportunidades quando ingressarem no mercado
de trabalho”, conta ela, que acredita que a disputa este ano está acirrada.
Este é o terceiro ano consecutivo que brasileiros aparecem na listagem dos dez
finalistas, mas nenhum levou o título. A competição, promovida pela
Fundação Varkey, é vista como o Prêmio Nobel da educação e contou com mais de
12.000 inscrições de mais de 140 países diferentes. O objetivo do prêmio de um
milhão de dólares é fazer com que os educadores sejam valorizados a nível internacional.
“O respeito aos professores vai além de um importante dever moral – é essencial
para para os resultados educacionais de um país”, reforça o fundador, Sunny
Varkey. Em 2019, o campeão foi o professor Peter Tabichi, criador de um clube
de ciências para crianças de diversas religiões em uma região assolada pela
fome no Quênia. “Podemos ser o país do futebol e do Nobel da Educação“, conclui
Doani. Que assim seja.