O prefeito do Município de
Cruzeta, José Sally de Araújo, foi condenado, em primeira instância, em virtude
de ato de improbidade administrativa, por ter feito doação ilegal de bens
públicos a particulares, durante exercício anterior de mandato de chefe do
Executivo naquela cidade. A doação ilegal dos terrenos a particulares foi feita
em desconformidade com as determinações da legislação e com a finalidade de
atender interesses pessoais, gerando prejuízo ao erário e violando princípios
norteadores da Administração Pública.
A condenação é do Grupo de Apoio às Metas do CNJ, equipe de juízes do TJRN especializada em casos de improbidade e crimes contra a administração pública, com as seguintes sanções: ressarcimento ao erário do valor do dano; pagamento de multa civil, em favor da municipalidade, nos termos do que preceitua o art. 18 da LIA, de duas vezes o valor do dano. Ambas devem ser acrescidas de juros e atualização monetária, contados a partir do dano ao erário. José Sally de Araújo também está proibido de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.
Acusação
Na Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa, o MP afirmou que
instaurou Inquérito Civil com fins de apurar supostas doações a particulares de
terrenos de propriedade do Município de Cruzeta, realizadas durante a gestão de
José Sally de Araújo, requisitando, para tanto, informações na esfera
administrativa e solicitando a cópia da Lei n° 905/08 (disciplinadora das
doações) ao Poder Legislativo do referido Município.
De acordo com o MP, foram mais
de 150 pessoas beneficiadas pelas doações dos imóveis, sem a devida autorização
legislativa à época, ou demonstração da necessidade dos beneficiários. Em
vistoria realizada, verificou-se a irregularidade do loteamento, por violação
das questões ambientais, falta de projeto e não possuir o devido registro
cartorário. A acusação alegou ainda que a doação foi realizada por contrato de concessão e
doação de bem público, sendo este instrumento inadequado para a referida
situação, em vista de ter havido a alienação definitiva dos bens, com nítido
dano ao erário. Denunciou que o procedimento não respeitou aos ditames legais,
não ocorrendo a licitação necessária, na modalidade concorrência, bem como não
houve a justificativa formal para a dispensa do procedimento licitatório.
Defesa
José Sally de Araújo defendeu a inaplicabilidade da Lei 8429/92 aos prefeitos e
sustentou que o contrato foi de concessão onerosa, inexistindo doação dos
terrenos a qualquer pessoa. Contou que os beneficiários estavam inseridos no
cadastro único de beneficiários de programas da prefeitura, razão pela qual se
legitimaram ao recebimento do imóvel, não havendo fraude ou qualquer tipo de
irregularidade na concessão.
O prefeito disse ainda que as concessões se basearam em parecer jurídico prévio e baseado na Lei Municipal n° 905/2008, que versa especificamente sobre doação de bens públicos. Alegou que as doações se deram de forma imparcial visando o desenvolvimento da política pública de ordenamento urbano de habitação no município, não agindo com dolo de qualquer espécie em sua conduta a configurar ato improbo.
Decisão
Segundo o grupo de julgamentos, em regra, é necessário a realização de
licitação, na modalidade concorrência, sendo essa dispensada nos casos de
doação, destinada exclusivamente para outro órgão ou entidade da Administração
Pública, de qualquer esfera, ressalvado se para fins de atendimento a programas
de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou
entidades da administração pública. A equipe de juízes percebeu que, contrariamente ao previsto pelo art. 4° da Lei
Municipal n° 905/2008 e ao que é defendido pelo gestor (que argumenta que os
terrenos foram concedidos às pessoas inscritas no Cadastro Único), o Ofício n°
0019/2014 da Secretaria Municipal de Assistência Social revelou que, de um
total de 157 pessoas, apenas 24 estavam realmente inseridas naquele cadastro,
desnaturando o objetivo das concessões/doações, concebidas para serem
disponibilizadas, com prioridade, para as pessoas participantes de programas e
projetos habitacionais de interesse social.
Outro elemento observado pelo grupo que reforça a irregularidade dos atos praticados pelo então prefeito é a cópia do Ofício n° 225/2014, expedido pelo Município, narrando a inexistência de qualquer procedimento administrativo para a efetivação das concessões/doações e que não houve prioridade às pessoas que participavam de programas habitacionais. “No caso, caberia ao requerido promover a instauração de procedimento administrativo como meio de realizar da licitação (na modalidade concorrência) ou formalizar e justificar sua dispensa, assegurando a legalidade, publicidade e controle pelos órgãos competentes dos atos praticados, especialmente por envolver patrimônio público, o que não se demonstrou”, concluiu a sentença.
(Processo nº 0100542-12.2016.8.20.0138)
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