O Tribunal de Contas do Estado (TCE/RN) decidiu nesta quarta-feira (17) determinar uma série de medidas que buscam evitar um quadro de insolvência para o pagamento de aposentados: o déficit atuarial do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) do RN atingiu a marca de R$ 54,3 bilhões. Esse desequilíbrio a longo prazo, que significa a diferença entre o que o Estado tem de recursos e o que precisará pagar no futuro em aposentadorias e pensões, aponta que não haverá dinheiro suficiente para honrar todos os compromissos. Diante da gravidade do quadro, num contexto de fiscalizações e auditorias regulares nos últimos anos que evidenciaram a crise no sistema previdenciário estadual, o TCE determinou que o Instituto de Previdência do Estado (Ipern) se abstenha de realizar novos resgates das aplicações financeiras do Fundo Previdenciário, além de, junto ao Governo do Estado, elaborar um plano de ação com medidas estruturantes para o reequilíbrio das contas, a ser apresentado no prazo de 60 dias úteis.
O plano de ação deve mostrar de forma clara como será feito o ajuste das contas da Previdência, reduzindo o déficit financeiro e equilibrando os recursos existentes com as despesas futuras de aposentadorias e pensões. As medidas precisam incluir um novo estudo atuarial, a elaboração de um projeto de lei a ser enviado à Assembleia Legislativa e a criação de estratégias que garantam a formação de reservas financeiras suficientes para sustentar os pagamentos no longo prazo. As determinações foram impostas no âmbito do processo nº 3136/2024-TC, durante julgamento realizado pelo Tribunal Pleno nesta quarta-feira (17). Os conselheiros aprovaram à unanimidade o voto-vista relatado pelo conselheiro Antonio Ed Souza Santana, entre os quais a relatora originária do processo, conselheira substituta Ana Paula Gomes, e o conselheiro Paulo Roberto Alves, que havia relatado um primeiro voto-vista. “É uma situação caótica. Alguma coisa precisava ser feita. E acho que ninguém melhor que o Tribunal de Contas, órgão constitucionalmente incumbido de fazer esse controle, sob o ponto de vista atuarial, previdenciário, legal, de legitimidade e economicidade, exercer o seu papel constitucional, com prudência e equilíbrio, e decidir nesses termos. É uma decisão, sob o meu ponto de vista, histórica”, disse o presidente Carlos Thompson Costa Fernandes após a decisão.
Déficit
triplicou em 10 anos
Segundo os
termos do voto apresentado pelo conselheiro Ed Santana, os dados demonstram um
crescimento exponencial do déficit. A projeção leva em consideração o total de
obrigações previdenciárias do Estado com os servidores públicos estaduais e os
ativos disponíveis no Fundo Previdenciário, que correspondiam, ao final de
2023, a apenas R$ 142 milhões, o equivalente a 0,29% dos compromissos
previdenciários totais.
Em 2024, o saldo negativo nas contas da Previdência chegou a R$ 1,83 bilhão — o que corresponde a mais de 10% de toda a receita do Estado. Dez anos antes, esse valor era de R$ 543 milhões. Ou seja, o déficit anual mais que triplicou no período. Ainda conforme o voto, o agravamento do quadro está relacionado à extinção do Fundo Previdenciário, com a transferência de seus recursos para o fundo financeiro, sem a devolução das reservas sacadas nem a devida compensação atuarial. Como consequência, o patrimônio acumulado foi rapidamente exaurido, o que compromete a sustentabilidade do regime, baseado em repartição simples, sem reservas garantidoras suficientes.
Uso
indevido de recursos
Segundo a
representação que originou o processo, produzida pela Diretoria de Controle de
Pessoal (DCP), o Ipern vinha usando, desde 2023, os rendimentos e até parte dos
recursos aplicados em fundos de investimento para bancar o pagamento mensal de
aposentados e pensionistas. “O risco não é apenas o colapso das contas
públicas, mas também a perda de credibilidade fiscal e de capacidade de
investimento do Estado”, alertou o conselheiro Antonio Ed Souza Santana.
Além das
medidas já citadas, o TCE também determinou que o Estado cubra com recursos
próprios eventuais insuficiências para pagamento de benefícios; preveja, nos
próximos orçamentos, valores suficientes para honrar os compromissos do RPPS; e
se abstenha de utilizar os recursos previdenciários de forma incompatível com
sua finalidade original.
Risco de
perder recursos federais
O TCE
também alertou para outro problema grave: a possibilidade de o Estado perder o
Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP), exigido pelo governo
federal para transferências voluntárias e contratação de empréstimos. Somente
entre 2023 e 2024, o Rio Grande do Norte recebeu mais de R$ 400 milhões em
recursos que dependiam desse certificado. Se o CRP for suspenso, esses repasses
ficam bloqueados.
O conselheiro acrescentou que, no último dia 7 de agosto de 2025, transitou em julgado a decisão do STF que legitimou a possibilidade de imposição de sanções pela União aos entes federativos que descumprirem as normas gerais de organização e funcionamento dos regimes próprios de previdência social.
PARA
ENTENDER
O que foi
decidido?
As
principais determinações aprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado são:
Ao Ipern:
Deve se
abster de utilizar recursos aplicados em investimentos de médio e longo prazo,
assim como seus rendimentos, para cobrir o déficit mensal da previdência. O
descumprimento resultará em multa de R$ 10 mil por ocorrência.
Ao Governo
do Estado:
Tem a
obrigação de garantir, com recursos do Tesouro Estadual, a cobertura completa
do regime próprio de previdência sempre que as contribuições normais e
extraordinárias não forem suficientes para o pagamento dos benefícios. O não
cumprimento também acarretará multa de R$ 10 mil por ato.
Ao Governo
do Estado e Ipern:
Devem
apresentar, em até 60 dias úteis, um plano de ação com medidas para amortizar o
déficit atuarial e reequilibrar a relação entre as reservas disponíveis e os
benefícios concedidos. O plano deve incluir:
* Estudo
atuarial atualizado
* Proposta
de projeto de lei a ser enviada à Assembleia Legislativa
*
Estratégias de capitalização de reservas
As
estratégias contemplam a destinação de imóveis para o fundo, implantação de
contribuições e aportes suplementares, instituição de nova segregação de
massas, além de outras alternativas previstas na legislação. Embora o plano
deva ser entregue em 60 dias, as medidas nele previstas têm até 35 anos para
serem concretizadas.
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