A representante do Fundo das
Nações Unidas para a Infância (Unicef), Erondina Silva, apesentou nessa
terça-feira (10) em Natal, durante o seminário Desafios e Experiências da
Educação no Nordeste, a proposta de um modelo de educação que não reprove os
estudantes. O evento foi promovido pela
Secretaria de Educação, do Esporte e do Lazer do Rio Grande do Norte, com o
apoio do Instituto Cultiva e do Consórcio Nordeste. Compareceram autoridades do
governo federal e dos nove estados da região. O encontro foi organizado
com o propósito de divulgar ações regionais que têm melhorado índices
educacionais e outros aspectos das comunidades escolares, como as relações
entre professores, alunos e familiares dos estudantes.

Durante a apresentação do
programa Avexadas para Aprender, implementado pelo governo do Rio Grande do
Norte, pela União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e o Itaú
Social, Erondina disse que considera a distorção idade-série a mais grave questão
educacional. O motivo, explicou, é a ligação direta desse fator com o que
se chama de fracasso escolar. O Avexadas para Aprender foi
feito no contexto da estratégia Trajetórias de Sucesso Escolar, do Unicef e, na
interpretação de Erondina, oferece uma forma de o estudante "contrariar
destinos". Segundo a representante do fundo esses fatores criam um
ciclo difícil de se quebrar, em que o estudante se sente cada vez mais
desmotivado para frequentar a escola. Por essa razão, ela chama
a atenção para a naturalização da reprovação de meninos e meninas do Norte e
Nordeste, das periferias dos grandes centros urbanos, pretos, indígenas e
pobres, que seriam, na sua perspectiva, endossadas pelas famílias em geral.
"Isso é uma cultura, está no nosso imaginário, inclusive das famílias. O
pai, às vezes, fala: Vai ser melhor para ele", evidenciando que há mais de
4,3 milhões de estudantes com distorção idade-série.
Os principais objetivos do
programa são, de modo simples, atenuar o sentimento de desânimo que muitos
estudantes sentem ao ter um desempenho considerado ruim - alguns deles,
inclusive, encarando reprovações de série -, evitar que deixem a escola e
enfrentar a distorção idade-série (de dois anos ou mais de atraso escolar). Desde janeiro, o Avexadas para
Aprender foi ganhando complexidade mês a mês. Em junho, por exemplo, as equipes
já falavam de língua portuguesa, alfabetização e multiletramento, termo que
comporta diversidades e se distancia, portanto, de um sistema escolar
excessivamente rígido. Nesse caso, uma palavra que abarca o mundo digital, que
não fica mais fora da rotina dos alunos e, consequentemente, dos currículos.
Escola rural
A Bahia é um dos estados mais
populosos do Brasil. Embora os ventos e as águas do mar da primeira capital do
país ainda carreguem mensagens, grande parte delas é difundida pelos veículos
digitais. Criado em 2023, pela Secretaria de Educação do estado e o Instituto
Anísio Teixeira (IAT), o projeto Agência de Notícias na Escola adicionou
criatividade ao demonstrar como assimila um princípio da Base Nacional Comum
Curricular (BNCC). Por meio da produção de
notícias, os estudantes exercitam o pensamento crítico, a cidadania e o
trabalho colaborativo referenciados na BNCC. Cada escola selecionada recebe R$
20 mil, em média, para a compra de equipamentos como notebook,
câmeras e microfones.
O IAT colabora com formação e
assessoria técnica e pedagógica. A abordagem tem como base o "aprender
fazendo" (learning by doing), de Anísio Teixeira e outros
pensadores. Em um ano de funcionamento, o
projeto aumentou sua presença. O total de escolas participantes passou de 50
para 81, distribuídas em 74 municípios. Atualmente, 162 professores e 855
estudantes estão no programa, que proporcionou relações mais horizontais, em
lugar das hierarquizadas, reconhecimento dos estudantes pelo que produzem,
aprimoramento de habilidades de leitura, escrita, pesquisa e argumentação.
Outros benefícios foram o maior contato com seus territórios e o
desenvolvimento da autonomia e da responsabilidade, além de a agência poder ser
uma via de expressão para eles. Graduada em Letras e mestre em
Linguagens, a educadora Charlene de Jesus diz que há cinco anos apenas é que
foi se descobrir como mulher negra. Ali começou a dividir, com suas turmas, o
que foi aprendendo sobre letramento racial.
Ela conta que os estudantes
vão cobrir um evento que será realizado dentro de alguns dias, em Salvador, e
que já estão fazendo até reuniões de pauta, como acontece no jornalismo
profissional, em que repórteres e chefias definem o que será apurado e publicado.
Uma das alunas, de 17 anos e que vem desempenhando a função de repórter, se
identificou com a carreira. "Ela diz: minha vontade é continuar nessa
área", relata Charlene, que atua no Colégio Estadual Professor Carlos
Valadares, no município de Santa Bárbara. "É importante mostrar a eles que
é necessário fazer um trabalho de qualidade, entregar a essa comunidade, a
esses jovens. São jovens falando com jovens. Eles têm uma linguagem própria.
Se
eu falasse, talvez não tivesse o alcance que eles têm", observa. "A
gente também trata de educação midiática, a importância de discutir fake
news na escola, de trazer outros temas, como o Enem [Exame Nacional do
Ensino Médio], o mercado de trabalho, valorizar o curso técnico que tem
na escola", acrescenta a educadora. Os alunos do projeto já
tiveram um momento emocionante na cobertura da agenda da ministra da Cultura,
Margareth Menezes, na capital, durante os encontros de representantes do G20.
Paralelamente, estão ativos mais dois veículos: o Suplemento Literário
Escolar e o Sertãocast, tocados por outros professores. "A gente tem que
parar de diminuir o aluno. Essa educação que não permite mais eu me colocar em
patamar acima do aluno. Eu sou mediadora daquele conhecimento, porque tenho
mais experiência, mas eles fazem uma troca que é imensa", finaliza
Charlene.