
Em depoimento ao juiz
federal Sergio
Moro nesta quarta-feira, o ex-ministro da Fazenda e da Casa
Civil Antonio
Palocci, preso pela Operação
Lava Jato, incriminou o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva na ação penal em que o petista é suspeito
de ter recebido propinas da Odebrecht por
meio de um apartamento vizinho ao do ex-presidente, em São Bernardo do Campo,
ABC paulista, e da compra de um imóvel que abrigaria a sede do Instituto Lula. Detido em Curitiba desde setembro de 2016, Palocci
reconheceu ao magistrado que a denúncia do Ministério Público Federal
“procede”, disse ter participado das tratativas de vantagens indevidas e
afirmou que a relação entre os governos petistas e a empreiteira era “bastante
intensa, movida a vantagens dirigidas à empresa e propinas pagas pela Odebrecht
para agentes públicos”. Palocci citou um “pacto de sangue” entre o
empresário Emílio Odebrecht e Lula, que teria envolvido um “pacote de propinas”
ao petista no final de seu mandato no Palácio do Planalto, em 2010. “O doutor
Emílio Odebrecht fez uma espécie de pacto de sangue com o ex-presidente Lula.
Ele procurou o ex-presidente nos últimos dias de seu mandato e levou um pacote
de propinas que envolvia esse terreno do instituto, que já estava comprado e o
seu Emílio apresentou ao presidente, o sítio para uso da família do presidente,
que já estava fazendo a reforma, fase final, ele disse que o sítio já estava
pronto. E também disse ao presidente que ele tinha à disposição para fazer
atividades políticas dele 300 milhões de reais”, contou o ex-ministro.
Segundo Antonio Palocci, o acerto com Lula teria
sido firmado porque a Odebrecht “se mostrou muito tensa” com a posse de Dilma
Rousseff, que já se posicionara contra interesses da empresa na construção de
hidrelétricas no Rio Madeira. O ex-ministro disse ter ficado “chocado” com a oferta
do empresário ao ex-presidente, relatada a ele pelo próprio Lula em uma
conversa no Palácio da Alvorada, no final de 2010. Palocci relata ter sido encarregado pelo petista de
tratar sobre os recursos com Marcelo Odebrecht, filho de Emílio, que propôs a
criação de uma planilha para manejo do dinheiro prometido. Em uma das primeiras
conversas com o empreiteiro, no entanto, Marcelo alegou engano de seu pai e
reduziu o valor a 150 milhões de reais. A promessa voltou a ser de 300 milhões
de reais depois de reunião entre Emílio Odebrecht, Lula e Dilma. “O presidente
Lula me chama de novo e fala: ‘olha, o Emílio veio, tivemos uma ótima reunião,
ele confirmou os 300 milhões e falou que pode ser mais se necessário”, declarou
o ex-ministro. No depoimento, ele ainda reconheceu “achar” ser ele
o “Italiano” que dava nome à conta-corrente da propina mantida entre Odebrecht
e PT, embora tenha ressaltado que seus interlocutores na empreiteira nunca o
trataram por tal alcunha.
Antonio Palocci explicou que a relação entre os
governos petistas e a maior empreiteira do país não era “linear” e
“permanentemente pacífica”, mas que o relacionamento era “fluido” e envolvia
favorecimentos à empresa e doações de campanha. “A Odebrecht, em particular,
tinha uma relação fluida com o governo em todos os aspectos. Partindo de
aspectos de realização de projetos, assim como participação em campanhas. A
participação em campanhas se dava de todas as maneiras, a maior parte com caixa
um, mas o caixa um muitas vezes originário de atitudes e contratos ilícitos”,
disse Antonio Palocci. A campanha eleitoral de 2014, conforme Palocci, foi
a que mais teve recursos ilícitos travestidos de doações oficiais, declaradas à
Justiça Eleitoral. “Foi a campanha que mais teve caixa um, e foi uma das
campanhas que teve mais ilicitudes. Porque o crime se sofisticou no campo
eleitoral. As pessoas viram que o problema é o caixa dois, então foram
transformando progressivamente tudo em caixa um, só que a ilicitude está fora
do pagamento. É a origem criminosa dos valores, esse é o ponto”, afirmou.
Petrobras
Antonio Palocci também confirmou que “quase
todos” contratos da empreiteira com a Petrobras geraram “créditos” ao PT. De
acordo com o ex-ministro, Lula o procurou em 2007, após ser reeleito, e mostrou
algum incômodo com os relatos de corrupção nas diretorias de Serviços e de
Abastecimento da estatal, feudos de PT e PP comandados por Renato Duque e Paulo
Roberto Costa, respectivamente. “Ele falou que estava pensando em tomar
providências, não estava gostando porque a coisa estava repercutindo de forma
muito negativa.
Mas logo após veio o pré-sal e o pré-sal pôs o governo em uma
atitude muito frenética em relação à Petrobras. Esses assuntos de ilícitos e de
diretores ficaram em terceiro plano, as coisas continuaram correndo do jeito
que era”, contou. Ainda segundo Palocci, a descoberta das reservas de
petróleo não apenas freou a intenção do ex-presidente em agir contra o esquema,
mas estimulou o apetite por mais propina. “Ele até chegou a encomendar que
os diretores a partir daí fizessem mais reservas partidárias”, disse o
ex-ministro.
O
processo
Neste processo, Lula é acusado pelo Ministério
Público Federal dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por
supostamente ter recebido propinas de 13 milhões de reais da Odebrecht.
Parte do dinheiro, 12,4 milhões de reais, sustentam
os procuradores, teria sido gasta na compra de um terreno para abrigar a sede
do Instituto Lula em São Paulo – o instituto acabou sendo construído em outro
endereço. Outros 504.000 reais teriam sido usados na compra da cobertura
contígua à de Lula no edifício Hill House, em São Bernardo do Campo (SP).
As
duas compras teriam sido feitas por meio de laranjas: no caso do terreno, o
empresário Demerval Gusmão; no caso da cobertura, Glaucos da Costamarques,
primo do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula. Serão julgados nessa ação penal o ex-presidente,
Antonio Palocci, Gusmão, Costamarques, o empreiteiro Marcelo Odebrecht, o
ex-assessor de Palocci Branislav Kontic, e o advogado de Lula, Roberto
Teixeira.
Defesa
A assessoria do ex-presidente Lula afirma que as
acusações de Antonio Palocci são falsas e só podem ser compreendidas como
tentativa de se livrar da prisão, dizendo o que o Ministério Público
Federal deseja. O ex-ministro negocia um acordo de delação premiada com a
força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba.
“A história que Antonio Palocci conta é
contraditória em relação a outros depoimentos de testemunhas, réus, delatores
da Odebrecht e provas e que só se compreende dentro da situação de um homem
preso e condenado em outros processos pelo juiz Sergio Moro que busca
negociar com o Ministério Público e o próprio juiz um acordo de delação
premiada que exige que se justifique acusações falsas e sem provas contra o
ex-presidente Lula”, diz nota assinada por Cristiano Zanin Martins, defensor do
petista.
De acordo com a defesa, o ex-ministro repete o que
ocorreu com Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, que também
confirmou ao MPF que o tríplex do Guarujá estava reservado a Lula e era
fruto de propinas por contratos na Petrobras. “Palocci repete o papel de réu
que não só desiste de se defender, como, sem o compromisso de dizer a verdade,
valida as acusações do Ministério Público para obter redução de pena e que, no
processo do tríplex, foi de Léo Pinheiro”, afirma.
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