De acordo com a OAB, a lista das 139 instituições contempla cerca de 10% dos 1 300 cursos superiores de direito no Brasil (iStockphoto/Getty Images/Getty Images)
Graduação mais procurada do país, o curso de
Direito deverá passar pelas mudanças mais significativas em 14 anos. O
Conselho Nacional de Educação (CNE) vai propor modernizar os currículos da
graduação para adaptar o que se ensina ao que se vê no cotidiano dos
escritórios de advocacia e às diversas realidades regionais. A expectativa é de
concluir essa discussão até setembro, após quatro anos de debates. Números do Ministério da Educação (MEC) mostram
que, de 2004 a 2016 (último com dados disponíveis), o total de graduações em
Direito cresceu 49%. Já a oferta de vagas aumentou 61% no período.
A nova proposta mantém a carga horária mínima de 3,7
mil horas, espalhada por cinco anos. Cerca de 50% da carga poderá ser formada
por disciplinas optativas, “a fim de que se possa garantir um aprendizado capaz
de enfrentar os problemas e desafios impostos pelo constante processo de
inovação pelo qual passa o mundo”, diz o texto da proposta. “A atuação esperada do profissional do Direito
mudou, queremos estimular e ampliar o contato desses alunos com os futuros
empregadores, com os desafios que vão encontrar na profissão. Não será um curso
voltado para o exame da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil)”, diz Luiz Roberto
Curi, que preside a comissão do CNE que estuda as mudanças.
Foi a própria OAB quem sugeriu mudanças
nas diretrizes em 2013, pela preocupação com a qualidade dos cursos que
proliferavam pelo país. “O MECautorizou a abertura de centenas de cursos,
sem que houvesse garantia de qualidade e real demanda por essas vagas. Havia
preocupação, que se agravou nos últimos anos, com a qualidade do ensino, já que
no exame da Ordem não conseguimos aprovar mais do que 20% dos inscritos”, diz
Marisvaldo Cortez, presidente da Comissão de Educação Jurídica da OAB. Com a expansão acelerada de novos cursos, Cortez
avalia que indicar às instituições a elaboração de currículos mais
diversificados pode ajudar a “desafogar” o mercado de trabalho. “Temos quase
1,2 mil cursos de Direito, todos com praticamente o mesmo currículo, sem adotar
novas metodologias de ensino e sem pensar os novos desafios da profissão. Podem
criar disciplinas, mais inovadoras. Hoje, por exemplo, não temos matéria sobre
Direito Eleitoral, que é um campo importantíssimo.”
As diretrizes do CNE servem como parâmetro para que
as faculdades formulem o projeto pedagógico. O problema é que muitas
instituições as entendem como “currículo único” e não oferecem disciplinas mais
ligadas ao contexto local ou aos interesses dos alunos. “Algumas faculdades tendem a copiar o currículo de
escolas bem-sucedidas. Copiar o programa da USP (Universidade de São Paulo) em
uma instituição do interior da Paraíba não vai funcionar. Porque você não tem a
mesma estrutura, os mesmos professores. Queremos estimular cada faculdade a
desenhar um projeto de acordo com a sua realidade”, afirma Antonio Freitas,
relator da proposta no CNE e pró-reitor da Fundação Getulio Vargas (FGV). Para ele, o currículo deve se conectar ao mercado
local: uma faculdade em Mato Grosso, por exemplo, pode ter mais conteúdo ligado
ao agronegócio. Já em São Paulo, pode haver foco maior no mercado financeiro.
Após a aprovação pelo MEC da mudança, as faculdades terão um ano para se
adaptar.
Mudança
Há três anos, a USP iniciou mudança curricular na
Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, com redução da carga de
disciplinas obrigatórias e ampliação de eletivas. “Mantivemos carga de formação
básica forte, mas é impossível dar formação técnica de conteúdos em todas as
áreas do Direito. Precisaríamos de um curso de dez anos.
Ampliamos a
oportunidade de o aluno escolher a grade de acordo com a atividade que projeta
desenvolver após se formar”, diz Floriano Marques, diretor da faculdade. No 3.º ano do curso da USP, Gustavo Luiz Vieira, de
24 anos, avalia positivamente as mudanças, por permitir mais dedicação à área
em que se pretende atuar. “Não vou saber tudo sobre todas as áreas do Direito.
É melhor que possa me dedicar ao que vai me ajudar futuramente”, diz ele, que
pretende trabalhar em Direito Constitucional.
MEC
O Ministério da Educação (MEC) diz não considerar a
expansão da oferta de cursos e vagas em Direito como indicativo de “má
qualidade”, uma vez que a autorização depende de avaliação da pasta. Afirma
ainda que os procedimentos de avaliação indicam “qualidade (das graduações de
Direito) até acima de outros cursos”.
A abertura de vagas e cursos é regulada com base em
infraestrutura, corpo docente e projeto pedagógico da instituição, que recebe
nota de 0 a 5. O MEC fixa a nota 4 como mínima para aumentar vagas de Direito –
esse patamar é 3 para outros cursos. Segundo a pasta, não há “justificativa
legal ou com base nos resultados regulatórios para a suspensão ou modificação
de processos de autorização” dos cursos da área, em resposta aos pedidos de
maior rigor da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).