
Uma ação realizada pelo Grupo Móvel de Fiscalização do Ministério do
Trabalho resgatou nesta semana 25 trabalhadores submetidos a trabalho
degradante na zona rural de Carnaubais, no Rio Grande do Norte. Eles
trabalhavam de forma informal na extração da palha das palmeiras nativas e em
cerâmicas locais. Nas áreas de extração fiscalizadas foram resgatados 19 trabalhadores, dos
quais 10 laboravam e pernoitavam no meio da mata, e outros nove que estavam
pernoitando no interior do baú de um velho caminhão que servia como local de
moagem. Outros seis foram resgatados em cerâmicas locais. Eles dormiam no
local, sem as mínimas condições de higiene e segurança. “As palhas de carnaúba são amarradas e submetidas ao processo de secagem,
com a disposição da matéria-prima no chão para exposição ao sol. Uma vez seca,
a palha é ‘batida’ em maquinário próprio, processo pelo qual se extrai o pó da
carnaúba. O pó é vendido então para a indústria, passando muitas vezes pela mão
de intermediários que o transformam em cera utilizada em produtos automobilísticos,
cosméticos e componentes eletrônicos”, explica a coordenadora da ação, Gislene
Ferreira dos Santos Stacholski.
Na primeira propriedade de extração fiscalizada, de 15 trabalhadores que
atuavam no meio da mata, todos na informalidade, cinco dormiam em redes
presas aos troncos das árvores, inclusive no tronco das carnaúbas. “O
empregador fornecia apenas uma lona para que fosse utilizada caso chovesse”,
conta a coordenadora. Os fiscais constataram que nenhum dos 15
trabalhadores contratados na propriedade havia sido registrado. Cada empregado
recebia uma média de R$ 300 a R$ 350 por quinzena, já descontados o valor
referente à alimentação, de acordo com a produção da equipe. Segundo ela, a “degradância das condições de vida e trabalho desses
trabalhadores se ampliava ainda mais porque, afora a falta de alojamento,
nenhuma estrutura que compõe uma área de vivência minimamente digna era
ofertada a eles”. Não havia instalações sanitárias ou chuveiros para banho. “A falta de
disponibilização de banheiro obrigava todos os trabalhadores a satisfazerem
suas necessidades de excreção no mato, nas proximidades do rancho, sem
condições mínimas de saúde, higiene, conforto ou privacidade”, explica Gislene
Stacholski. Os empregados tomavam banho no meio da vegetação, a céu aberto, sem
o mínimo de privacidade, com a utilização de baldes de água.

A auditora relata que o local também não dispunha de estrutura adequada
para preparo e conservação de alimentos e consumo de refeições. O cozinheiro
utilizava fogareiros improvisados no chão do rancho. “Os empregados cavavam um
buraco no chão para colocar a madeira e, em cima, uma grelha de ferro, que
servia de suporte para as panelas. Não havia também local para as refeições,
que eram consumidas com os trabalhadores em pé, nas redes, sentados no chão ou
sobre tocos de madeira”, destaca a auditora do Ministério do Trabalho. Os pertences pessoais dos trabalhadores ficavam pendurados e espalhados
no rancho, no chão ou em galhos de árvores, e os trabalhadores não recebiam
Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) obrigatórios. “As botas que usavam
estavam em péssimo estado de conservação, tendo sido adquiridas com recursos
próprios, ou eles usavam apenas chinelos comuns”, ressalta. Na segunda área fiscalizada, os nove trabalhadores dormiam na carroceria
fechada de um caminhão. Todos foram resgatados, pois a estrutura do veículo não
garantia estabilidade ou conforto térmico no seu interior, o que deixava os
obreiros sujeitos às variações do clima. “A ventilação era deficitária, pois o
pequeno corte feito na lateral do baú não era suficiente para a correta
renovação e circulação do ar, sobretudo considerando a sujidade do local com
amontoados de palha e de pó da carnaúba e a sua superlotação. A esses
problemas se soma a falta de uma estrutura de coleta e depósito de lixo,
favorecendo a ausência de higiene e organização”, relata a auditora.
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Segundo Gislene Stacholski, a degradância das condições de vida e
trabalho desses trabalhadores se ampliava porque, “afora a falta de alojamento,
nenhuma estrutura que compõe uma área de vivência minimamente digna era
ofertada aos trabalhadores”. Ela diz que não havia instalações sanitárias,
chuveiro para banho, local adequado para preparo, conservação e tomada de
refeições. Fora isso, não eram fornecidos água potável e EPIs obrigatórios aos
empregados. Em outra área de extrativismo fiscalizada foram resgatados cinco
obreiros, que haviam sido recrutados do município de Assu, no interior do
estado, para executar a extração, secagem e moagem da palha de carnaúba. O pó
resultante desse processo era vendido a cerâmicas locais. Eles viviam e
pernoitavam no meio do carnaubal, sem nenhum alojamento. O pernoite era feito
em redes compradas pelos próprios rurícolas e estendidas no meio do mato, entre
árvores que lhes dessem um mínimo de sustentação.
Os trabalhadores tinham ainda que arcar com os custos dos EPIs, como
botas, luvas, camisas de manga longa, bonés árabes para proteção solar e
outros. Também tinham que pagar pelas ferramentas de trabalho, como as lâminas
utilizadas no corte da palha das palmeiras de carnaúba, conhecidas como
“quicé”. Nas cerâmicas fiscalizadas, os trabalhadores atuavam na fabricação de
tijolos e lajotas de cerâmica. Trabalhavam durante o dia e pernoitavam no local
de produção, em pequenos alojamentos no pátio das cerâmicas. “A localização do
alojamento, dentro do parque industrial das cerâmicas, é inadequada, sendo uma
área de circulação de materiais e pessoas, sem condições adequadas para abrigar
trabalhadores. Além disso, apresentavam problemas de manutenção, higiene e
asseio”, diz a auditora. Não havia instalações sanitárias, e as necessidades fisiológicas de todos
os trabalhadores eram satisfeitas no mato. O local também não continha armários
para as roupas e os objetos pessoais, nem camas para descanso. Os alimentos
eram preparados e cozidos em fogueira improvisada no chão e consumidos de forma
precária, em meio aos tijolos. “As condições de trabalho também eram marcadamente inseguras, com
diversas irregularidades que ensejavam risco grave e iminente, com ausência
total de medidas necessárias e suficientes de controle dos riscos, tanto que
todas as máquinas foram interditadas por não possuir os requisitos mínimos de
proteção de contenção de projeção de peças, materiais, com exposição de
correias e partes perigosas. Somavam-se a isso diversos riscos elétricos, que
se espalhavam por todo o ambiente de trabalho”, esclarece a coordenadora da
ação. Por descumprir a legislação trabalhista e manter os trabalhadores em
condições de degradância, os empregadores foram autuados pela fiscalização e
terão de arcar com os custos de rescisão trabalhistas a todos não registrados e
aos resgatados, que alcançam R$ 43 mil para os operários da atividade de
extração de carnaúba e R$ 22 mil para os trabalhadores das cerâmicas. Os
empregadores terão ainda que arcar com o recolhimento do Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço (FGTS) de todos os funcionários. Os resgatados receberão ainda
do Ministério do Trabalho três parcelas do seguro-desemprego a que têm direito. A operação do Ministério do Trabalho contou com a participação de
representantes do Ministério Público do Trabalho, do Ministério Público
Federal, da Defensoria Pública Federal e da Polícia Federal.