As alterações realizadas pela
Câmara dos Deputados na regulamentação da reforma tributária elevaram a
projeção da alíquota do novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) de 26,5% para
28%, segundo cálculos do Ministério da Fazenda. Se confirmada, será a maior
cobrança do mundo, de acordo com dados da Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE). Atualmente, o ranking global é liderado pela
Hungria, que tem uma taxação de 27%. O cálculo da Fazenda, que foi
antecipado pelo jornal O Globo, leva em conta dez alterações realizadas pelos
deputados. A de maior impacto – e de maior controversa no Congresso – é a
inclusão das carnes na cesta básica com imposto zero. Esse item, sozinho,
elevou o IVA em 0,56 ponto porcentual. A inclusão foi fruto da pressão do setor
de alimentos e da bancada do agronegócio, e contou com o apoio do próprio
presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O tema, de forte apelo
popular, motivou um embate entre governo e oposição pela “paternidade” da
proposta – com troca de acusações de ambos os lados. Além das proteínas
animais, a Câmara aprovou tratamento diferenciado aos queijos, o que significou
impacto de 0,13 ponto na alíquota. Sal, farinhas, aveias, óleos, plantas e
flores, também contemplados com benesses, representaram mais 0,10 ponto no IVA. Para o advogado tributarista
Eduardo Fleury, doutor em Ciência da Tributação pela Universidade da Flórida
(EUA), com especialização em IVA, os números do governo vão ajudar no debate
sobre o projeto no Senado. Ele diz que o estudo confirma que o País terá a
maior alíquota padrão de IVA do mundo e aponta para o forte impacto da inclusão
na cesta básica de itens como carne, queijos e sal, além da redução da alíquota
para o setor imobiliário. “Foi um impacto forte.
Acredito que, neste momento, o governo quer deixar as coisas bem às claras,
para mostrar ao Congresso que tudo tem um custo”, disse.
Ao Estadão, o relator da
regulamentação no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), afirmou que a composição da
cesta básica ficou “desequilibrada”, mas que não vê viabilidade política para
se rediscutir o assunto. O texto deverá ser votado na Casa após as eleições
municipais, que serão realizadas em outubro. Durante as tratativas na
Câmara, os deputados incluíram no texto uma trava para evitar que a cobrança do
IVA ultrapassasse os 26,5%, como projetado inicialmente pela equipe econômica.
O limite passaria a valer a partir de 2033, após o período de transição da
reforma. Caso a alíquota superasse esse
patamar, o governo seria obrigado a formular, em conjunto com o Comitê Gestor
do IBS (o IVA estadual e municipal), um projeto de lei complementar com medidas
para reduzir a carga. Tributaristas e o relator do texto no Senado, porém, são
céticos em relação à eficácia desse teto, que poderá sofrer alterações.
O economista Eduardo Fleury
diz que, enquanto o Brasil vai ter a maior alíquota padrão do mundo, os
alimentos podem acabar tendo a menor, o que beneficiará os mais ricos. Ele
defende que o modelo de cashback (que devolve o imposto pago a famílias de baixa
renda) teria sido mais eficiente. “A hora que explicita que a
alíquota será de 28%, vai colocar o dedo na ferida. Isso está fazendo com que
as pessoas mais pobres melhorem de vida? O cashback permitia o mesmo efeito
sobre a baixa renda, mas sem ter esse impacto tão grande sobre a alíquota”,
afirmou.
Imóveis, medicamentos e
cashback
O segundo maior impacto, segundo a equipe econômica, é fruto do redesenho do
regime específico de bens imóveis. O texto da Câmara prevê, por exemplo,
desconto de 40% para as alíquotas cobradas de incorporadoras e construtoras. O
efeito, de acordo com a Fazenda, será de 0,27 ponto. Os medicamentos também
aparecem na lista, uma vez que os deputados concederam desconto de 60% para
todos aqueles registrados na Anvisa ou produzidos por farmácias de manipulação,
o que elevou em 0,12 ponto a cobrança do novo imposto. Já a ampliação do cashback, o
sistema de devolução de tributos, apresentou o menor impacto: 0,04 ponto. Por
pressão do PT, a Câmara ampliou de 50% para 100% a devolução da CBS (o IVA
federal) nas operações de fornecimento de energia elétrica, água, esgoto e gás
natural encanado.
A única alteração realizada
pelos deputados com potencial de redução da alíquota do IVA foi a inclusão dos
carros elétricos e dos jogos de azar – físicos e digitais (como as apostas
esportivas, as “bets”) – no escopo do Imposto Seletivo. Esse tributo recebe o
apelido de imposto do “pecado” por incindir sobre itens considerados nocivos à
saúde e ao meio ambiente. O impacto, porém, foi pequeno: uma redução de 0,06
ponto. A Câmara também incluiu o
carvão mineral nessa taxação extra. Só que, ao mesmo tempo, reduziu de 1% para
0,25% a alíquota máxima do Seletivo sobre os bens minerais extraídos. Com isso,
o resultado final foi um impacto positivo de 0,10 ponto.
FONTE: Estadão
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