Os professores brasileiros são alvo de mais intimidações e lidam em
proporção maior com o bullying entre os alunos do que a média internacional,
além de perderem mais tempo com atividades não relacionadas ao ensino. É o que
mostra a Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem (Talis, na sigla em
inglês), feita pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), com 250 mil professores e diretores de escolas de 48 países ou regiões. Em média, professores no Brasil usam só 67% do tempo em atividades
ligadas ao aprendizado.
O restante é dedicado a tarefas administrativas, como a
lista de presença, ou para manter a ordem na classe. A relação entre alunos e
deles com professores também preocupa. No Brasil, 28% dos diretores dizem ter
testemunhado intimidação ou bullying entre estudantes – o dobro da média da
OCDE. Semanalmente, 10% das escolas do país têm casos de intimidação, física ou
verbal, contra educadores, com “potenciais consequências para o bem-estar,
estresse e permanência na profissão”, diz a pesquisa. A média internacional é
de 3%. Quando os ataques miram funcionários da escola, o Brasil é o segundo –
atrás só do norte da Bélgica.
Ilustra essa estatística o caso de dez alunos que
atiraram cadeiras e livros contra uma professora em uma escola estadual de
Carapicuíba, Grande São Paulo, em maio. O vídeo da agressão se espalhou nas
redes sociais e nove envolvidos no caso chegaram a ser detidos. A professora Maria Carlota Galvão, que dá aulas de Artes em uma rede
municipal no litoral do Rio, diz ver o contexto de violência influenciar na escola
cotidianamente. “Os conflitos da escola vêm sempre um pouco de fora porque a
sociedade está toda desmoronando ao redor, mas precisamos ensiná-los a conviver
com todos esses relacionamentos que têm na família e entre si”, diz ela, de 48
anos.
Redes sociais
Relatos de intimidação não são incomuns, até fora do contexto escolar.
“Nas redes sociais, alguns alunos esquecem de que aquilo é um ambiente público
e ofendem (com mensagens contra o professor)”, conta a também professora
Lidiane Christovam, de 41 anos, que deu aulas de Matemática por mais de uma
década em colégios particulares da capital paulista e leciona em universidade
há cerca de dois anos.
Já a pesquisadora Luciana Lapa, do Grupo de Estudos e Pesquisas em
Educação Moral, ligado à Universidade Estadual Paulista (Unesp) e à Estadual de
Campinas (Unicamp), diz que a mediação de conflitos e de casos de bullying nas
escolas geralmente falha ao tratar o comportamento dos alunos. “Fica esquecida
a parte da reflexão, que é muito mais trabalhosa do que o castigo, a suspensão.
Você pune e não forma”, afirma a especialista. “É preciso uma intervenção não
apenas punitiva, mas que promova uma tomada de consciência.”
O relatório da OCDE destaca também o efeito cumulativo do desperdício de
tempo no aprendizado – poucos minutos durante as aulas representam dias
perdidos no fim do ano. O Brasil é o terceiro país com o pior aproveitamento de
tempo em classe, atrás apenas da África do Sul e da Arábia Saudita. Na média,
nos países que integram a OCDE, os professores aproveitam 78% da aula com as
atividades de ensino.
Falta de preparo
Especialistas dizem que o desempenho do país está relacionado à falta de
preparo dos professores – o que envolve desde inexperiência em sala de aula até
profissionais alocados em disciplinas fora de sua área de formação. E há a
falta de compreensão das demandas de alunos, cada vez mais estimulados pela
tecnologia. A professora Lidiane Christovam vê sobrecarga nas responsabilidades de
docentes. Diz que o tempo dedicado ao planejamento das aulas foi tomado por
demandas como o relacionamento constante com a escola e os pais, o uso das
plataformas digitais do colégio e a capacitação constante.
Ao mesmo tempo, acha
que atividades no contraturno muitas vezes tiram o tempo que os alunos têm para
socializar – por isso, usam o tempo da aula para isso. “De maneira geral, o professor, hoje, tem demanda maior para fornecer
material (didático) para portais escolares e, grosso modo, ele ampara o aluno
muito mais do que na minha época de estudante”, opina ela. Ao comentar os dados, o Ministério da Educação (MEC) disse que a pesquisa
ajuda o governo federal e as secretarias locais a abordarem a realidade do
ensino e da aprendizagem de forma mais assertiva.
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