A Associação dos Membros dos
Tribunais de Contas do Brasil, o Instituto Rui Barbosa e o Comitê Técnico de
Educação – IRB, emitiram manifesto ‘Em
Defesa do Direito Fundamental à Educação e de suas Garantias Constitucionais’,
em que elencam dispositivos da Constituição Federal que consubstanciam a
educação como “patrimônio jurídico inalienável”. As instituições afirmam que
as garantias previstas na CF não podem ser suprimidas, nem minoradas. Eventuais
alterações normativas, de acordo com o manifesto, haverão de se guiar por essas
balizas: “o Controle Externo brasileiro se manifesta pela interpretação
constitucional que assegure a máxima efetividade dos direitos fundamentais (em
especial a educação) e com as garantias que lhe amparam objetivamente o
exercício pleno”.
O documento faz referência
ao “legado civilizatório que prioriza a educação como trajetória de emancipação
humana e de desenvolvimento social e econômico” e registra o processo histórico
de que o dever de gasto mínimo educacional remonta à Constituição de 1934. As instituições signatárias
do manifesto concluem ressaltando o compromisso dos Tribunais de Contas do
Brasil com os direitos e garantias fundamentais, que são o “esteio do pacto
republicano a que se refere o art. 1º, III da Constituição, qual seja, a
dignidade da pessoa humana, finalidade última do Estado Democrático de
Direito”. Confira:
Em
defesa do direito fundamental à educação e de suas garantias constitucionais
Além da dimensão subjetiva
do cidadão que pode exigir plena e imediata eficácia do direito à educação, há
deveres estatais que lhe asseguram objetivo conteúdo operacional por meio,
sobretudo, do planejamento decenal, da repartição federativa de competências e
do financiamento vinculado. Em reforço do direito à
educação como patrimônio jurídico inalienável dos brasileiros, com base nos
arts. 60, § 4o, IV, 205 e 208, § 1o da Constituição de 1988, a dimensão
objetiva se faz presente em garantias de concretização por meio de políticas
públicas coordenadas na forma do plano nacional a que se refere o art. 214 da
Lei Maior.
Nesse sentido, a Associação
dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil – Atricon e o Instituo Rui
Barbosa – IRB vêm a público afirmar a natureza jurídica de garantia fundamental
e o seu compromisso com a efetivação dos seguintes dispositivos
constitucionais:
1) princípios que fixam o
conteúdo material da atividade do ensino, arrolados pelo art. 206, como, por
exemplo, acesso e permanência na escola, liberdade de aprender e ensinar,
pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, gratuidade do ensino público em
estabelecimentos oficiais, valorização dos profissionais da educação escolar,
gestão democrática do ensino público, padrão mínimo de qualidade nacional e
piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação pública;
2) autonomia universitária
(art. 207);
3) dever estatal de oferta
de educação básica obrigatória dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade
(incluída, portanto, a pré-escola), sob pena de responsabilidade da autoridade
competente (art. 208, I e § 2o), sem prejuízo das garantias de atendimento
educacional especializado às pessoas com necessidades especiais; ensino
infantil em creches para as crianças de 0 (zero) a 3 (três) anos de idade;
oferta de ensino noturno regular e atendimento suplementar ao educando por meio
de transporte, alimentação e material didático-escolar;
4) base nacional curricular
comum (art. 210);
5) responsabilidade
solidária no arranjo federativamente colaborativo do ensino (art. 30, VI e art.
211), assentada tanto no padrão mínimo de qualidade referido à equidade de
financiamento (art. 206, VII e art. 60 do ADCT), quanto no Sistema Nacional de
Educação – SNE (a que se referem o art. 214 da CF e o art. 13 da Lei
13.005/2014 – PNE);
6) vinculação orçamentária
protetiva do financiamento da educação, lastreada em dever de gasto mínimo
proporcional à receita de impostos para Estados, DF e Municípios (art. 212);
contribuição social do salário-educação (art. 212, §§ 5o e 6o); equalização
federativa com base em valor mínimo nacional anual por aluno (cuja metodologia
de cálculo deve, desde 2016, corresponder ao custo aluno qualidade inicial –
CAQi e ao custo aluno qualidade – CAQ previstos nas metas 7.21 e 20.6 a 20.8 do
PNE), segundo o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB (art. 60 do ADCT) e piso
federal lastreado, no mínimo, na garantia de correção monetária (art. 110 do ADCT);
7) planejamento decenal
atrelado aos objetivos de erradicação do analfabetismo; universalização do
atendimento escolar; melhoria da qualidade do ensino; formação para o trabalho;
promoção humanística, científica e tecnológica do país e meta de aplicação de
recursos públicos na educação como proporção do produto interno bruto (art.
214).
Aludido rol de garantias da
educação não pode ser suprimido ou minorado. Assim, o sempre desejável debate e
as eventuais alterações normativas haverão de se guiar por essas balizas. Diante da aventada hipótese
de extinção das vinculações orçamentárias, é preciso considerar que o horizonte
de necessária progressividade para o financiamento da educação guarda
correlação instrumental com os deveres constantes do art. 208 e com os desafios
arrolados pelo art. 214 da Lei Maior.
Enquanto a realidade ainda
revela a distância entre o compromisso constitucional e a situação de desamparo
intelectual de muitas crianças e jovens, não há como abdicar das vinculações
protetivas do financiamento da educação. Tais garantias de custeio representam,
assim, ponto de partida; não são, portanto, ponto de chegada, porque não são
suficientes, por si, para que seja resguardado o atingimento tempestivo das
metas e estratégias do Plano Nacional de Educação – PNE.
A vinculação orçamentária da
educação e sua equalização federativa nas sistemáticas do Sistema de Nacional
de Educação e do FUNDEB devem assegurar o atendimento das necessidades do
ensino obrigatório, no que se refere à universalização, à garantia de padrão de
qualidade e à equidade nos termos do plano nacional decenal que lhe orienta a
consecução das suas correspondentes políticas públicas. Cada R$ 1,00 vinculado
à educação precisa ser lido em conformidade com o PNE, em rota de plena
vinculação aos prazos de consecução das suas metas. Cabe reverenciar, pois, o
legado civilizatório que prioriza a educação como trajetória de emancipação
humana e de desenvolvimento social e econômico. A propósito, não é demasiado
retomar o registro histórico de que o dever de gasto mínimo educacional remonta
à Constituição de 1934 e somente foi mitigado pelas Cartas outorgadas de 1937 e
1967/1969.
Esse o contexto em que o
Controle Externo brasileiro se manifesta pela interpretação constitucional que
assegure a máxima efetividade dos direitos fundamentais (em especial a
educação) e com as garantias que lhe amparam objetivamente o exercício pleno.
Nesse quadro, sua atuação compreende não apenas a fiscalização das normas
vigentes, mas também a identificação, o estímulo e a difusão das boas práticas
educacionais adotadas em todo o território nacional.
Em conclusão, direitos e
garantias fundamentais são o esteio do pacto republicano a que se refere o art.
1o, III da Constituição, qual seja, a dignidade da pessoa humana, finalidade
última do Estado Democrático de Direito e, assim também, compromisso maior dos
Tribunais de Contas do país.
Brasília, 03 junho de 2019.
Fábio Túlio Filgueiras
Nogueira
Presidente da Atricon.
Ivan Lelis Bonilha
Presidente do IRB.
Cezar Miola
Presidente do Comitê Técnico
da Educação do IRB.